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Na obra de Eduardo Nunes, a paisagem não é uma categoria fixa nem um género pictórico a cumprir. É antes uma necessidade vital, anterior ao gesto técnico e ao conhecimento artístico — um impulso que nasce da experiência direta com o mundo, da excitação de ver e sentir lugares longínquos, estranhos, belos ou assustadores. A paisagem, para este artista, é o ponto de partida de uma relação intuitiva com a realidade, como um segundo sentido visual que o guia e o orienta.
Longe de qualquer naturalismo, estas pinturas recusam a submissão à explicação racional. Num mundo excessivamente cartografado, dominado pela tecnologia e pela ciência, Eduardo propõe a criação de “sobrepaisagens” — imagens que não pretendem ilustrar o espaço habitado, mas sim convocar a memória sensorial e afetiva da passagem por ele. São visões que surgem da interiorização de lugares vividos, onde a emoção, o estranhamento e a liberdade anárquica do gesto pictórico são mais importantes do que a fidelidade ao visível.
Entre a vontade de captar o real e o impulso de seguir o instinto, instala-se uma prática que desafia convenções: cor, mancha, luz e risco organizam-se segundo uma lógica própria, onde o prazer do olhar se torna essencial. A paisagem torna-se então uma forma de pensamento, um território simbólico e emocional que se constrói por camadas — ora difusas, ora vibrantes — sempre abertas à interpretação do espectador.
Através dessa prática contínua de observação e transformação, Eduardo Nunes afirma um olhar que, mais do que captar o mundo, procura fixar o instante em que esse mundo se torna emoção. Uma pintura que não explica: evoca, deslumbra, sugere.
Texto curatorial
Cristina Cabrita
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